segunda-feira, 22 de setembro de 2008

REMEXENDO O BAÚ


bom dia para todos!

este título "REMEXENDO O BAÚ", vem a calhar com este curso que agora estou fazendo. eu havia construído um blog, no outro curso, e havia me esquecido, quanta alegria senti com as minhas outras publicações, era um outro momento da minha vida que está registrado, estarei sendo egoísta eu sei, mas a minha felicidade é muito grande com este novo curso, pois pude me dar um tempo para organizar e pesquisar uma poesia para publicar, e descobri o que eu já tinha desde já digo: obrigadas meninas, por eu estar neste curso. voltando, quero muito poder ter condições de oferecer aos nossos alunos um pouco do que estou tendo aqui. conversando com uma amiga ela me colocou o seguinte: eu vou me encorajar usar mais o ambiente tecnológico da escola. eu fiquei tão feliz e abracei a causa vamos mesmo de verdade. no post anterior eu escolhi a poesia da Cora Coralina, "Criança, no meu tempo de criança, não valia mesmo nada. A gente grande da casa usava e abusava de pretensos direitos de educação". eram outros tempos é certo, mas hoje em dia eu não quero que as crianças lembrem de mim como pessoa mandona do ambiente tecnológico educacional, e que não deixava ou não ajudava os professores a oferecem este ambiente que é deles. dos alunos. quero ser lembrada como alguém que sonhou junto, compartilhou e que as vezes nas incertezas não disse não. abraços edi

LER DOCE LER

Antiguidades
Quando eu era menina bem pequena,em nossa casa,certos dias da semanase fazia um bolo,assado na panelacom um testo de borralho em cima.
Era um bolo econômico,como tudo, antigamente.Pesado, grosso, pastoso.(Por sinal que muito ruim.)
Eu era menina em crescimento.Gulosa,abria os olhos para aquele boloque me parecia tão bome tão gostoso.
A gente mandona lá de casacortava aquele bolocom importância.Com atenção. Seriamente.Eu presente.Com vontade de comer o bolo todo.
Era só olhos e boca e desejodaquele bolo inteiro.Minha irmão mais velhagovernava. Regrava.Me dava uma fatia,tão fina, tão delgada...E fatias iguais às outras manas.E que ninguém pedisse mais !E o bolo inteiro,quase intangível,se guardava bem guardado,com cuidado,num armário, alto, fechado,impossível.
Era aquilo, uma coisa de respeito.Não pra ser comidoassim, sem mais nem menos.Destinava-se às visitas da noite,certas ou imprevistas.Detestadas da meninada.
Criança, no meu tempo de criança,não valia mesmo nada.A gente grande da casausava e abusavade pretensos direitosde educação.
Por dá-cá-aquela-palha,ralhos e beliscão.Palmatória e chineladasnão faltavam.Quando não,sentada no canto de castigofazendo trancinhas,amarrando abrolhos."Tomando propósito".Expressão muito corrente e pedagógica. Aquela gente antiga,passadiça, era assim:severa, ralhadeira.
Não poupava as crianças.Mas, as visitas...- Valha-me Deus !...As visitas...Como eram queridas,recebidas, estimadas,conceituadas, agradadas!
Era gente superenjoada.Solene, empertigada.De velhas conversarque davam sono.Antiguidades...
Até os nomes, que não se percam:D. Aninha com Seu Quinquim.D. Milécia, sempre às voltascom receitas de bolo, assuntosde licores e pudins.D. Benedita com sua filha Lili.D. Benedita - alta, magrinha.Lili - baixota, gordinha.Puxava de uma perna e fazia crochê.E, diziam dela línguas viperinas:"- Lili é a bengala de D. Benedita".Mestre Quina, D. Luisalves,Saninha de Bili, Sá Mônica.Gente do Cônego Padre Pio.
D. Joaquina Amâncio...Dessa então me lembro bem.Era amiga do peito de minha bisavó.Aparecia em nossa casaquando o relógio dos fradestinha já marcado 9 horase a corneta do quartel, tocado silêncio.E só se ia quando o galo cantava.
O pessoal da casa,como era de bom-tom,se revezava fazendo sala.Rendidos de sono, davam o fora.No fim, só ficava mesmo, firme,minha bisavó.
D. Joaquina era uma velhagrossa, rombuda, aparatosa.Esquisita.Demorona.Cega de um olho.Gostava de flores e de vestido novo.Tinha seu dinheiro de contado.Grossas contas de ourono pescoço.
Anéis pelos dedos.Bichas nas orelhas.Pitava na palha.Cheirava rapé.E era de Paracatu.O sobrinho que a acompanhava,enquanto a tia conversavacontando "causos" infindáveis,dormia estiradono banco da varanda.Eu fazia força de ficar acordadaesperando a descida certado boloencerrado no armário alto.E quando este aparecia,vencida pelo sono já dormia.E sonhava com o imenso armáriocheio de grandes bolosao meu alcance.
De manhã cedoquando acordava,estremunhada,com a boca amarga,- ai de mim -via com tristeza,sobre a mesa:xícaras sujas de café,pontas queimadas de cigarro.O prato vazio, onde esteve o bolo,e um cheiro enjoado de rapé.

Cora Coralina